Nos últimos tempos tem vindo à baila a questão "melindrosa" que consiste em saber se devem ou não ser tributados os ricos.
Uns são imediatamente a favor, até porque se trata de uma questão de elementar justiça, mas outros dizem que essa questão é muito "delicada", por razões diversas:
A primeira é que os ricos têm muita influência nos órgãos de poder económico, político e judicial, instâncias onde tudo se decide e organiza. Por isso estão à vontade, e fazem como querem. Na sua mão estão as fábricas, o dinheiro e os mecanismos de produção e distribuição. Deles depende a regulação dos mercados e o estabelecimento dos preços, a alteração das regras da concorrência, a ativação ou morigeração dos mercados, a flutuação do mercado bolsista e, até, a regulação artificial, se necessário, da inflação, para influir nas variáveis comerciais e monetárias indispensáveis ao lucro de que não estão dispostos a abdicar, sem curar de saber se isso afeta os magros rendimentos das classes mais pobres, consumidores diretos das suas fábricas e centros comerciais.
A segunda razão é que os ricos dominam a banca, as zonas francas, os "ofJshore" e os "paraísos fiscais ", onde rapidamente colocam os seus rendimentos, escapando, assim, ao pagamento de impostos e ao controle das suas fortunas.
A terceira é a chantagem sobre o Estado, ameaçando desinvestir ou desviar as sedes das suas empresas para o estrangeiro ...
Para os mais ricos, as crises são sempre benéficas. Basta ver que tem aumentado o número dos que enriquecem, à medida que a classe média fica cada vez mais pobre e a pobreza vai alastrando, atingindo as fronteiras da miséria.
Temos vindo a assistir, estupefactos, ao despudor de algumas afirmações - autênticas blasfémias - de homens cotados entre os mais ricos do mundo. Um diz, por exemplo, que estabelecer um imposto especial sobre a riqueza não iria resolver nada, pelo que, acha ele, mais vale deixar as coisas como estão. Outro (cotado entre os mais ricos do mundo) diz que é um simples operário, subentendendo-se daí que ganhará qualquer coisa como o salário mínimo.
Ofensas destas em relação a quem paga do seu magro salário os impostos para sanear as finanças do Estado e cobrir os desfalques de bancos pilhados e esbulhados por alguns ricos; insolências gravosas e desavergonhadas, proferidas, ainda por cima, sem gaguejar, em português de analfabetos, por homens que já se esqueceram das suas origens pobres e humildes e que enriqueceram com a ajuda de operários pobres e humildes como eles foram; presunçosos e arrogantes senhores que se passeiam, com soberba e indiferença, pelas mesmas ruas e locais onde muitos pobres, envergonhados e cabisbaixos, não sabem como será o dia de amanhã da sua família (pagar rendas, comprar medicamentos, adquirir livros para os filhos, ter pão na mesa...) - são pecado que brada aos céus.
Sem querer ofendê-los, gostaria de lhes fazer uma sugestão que poderão, sem grande esforço, aplicar numa das suas viagens profissionais - aquelas que fazem de um mercado para o outro em avião privado ou em carreira normal - para estimular os seus negócios: leiam com atenção o que vem no Evangelho (Lc. 12, 16-21). Não se ofendam com a sugestão, sobretudo os que passam pela Igreja com alguma frequência, porque esses não podem omitir essa passagem. Volto a lembrar que é apenas uma sugestão. Quem sou eu para ousar moralizar! Mas as palavras que lá estão não são minhas, embora, sem dúvida, se apliquem a todos.
Às vezes parece-me, como aconteceu na parábola, que há coisas que, por mais que se digam, alguns não querem ouvir, ou julgam, hipocritamente, que isso não é para eles.