Texto do Diácono António Poças, publicado no
Jornal João Semana de 15 de Outubro
São tantas as surpresas desagradáveis, que pouco sobrará para nos espantar. Só mesmo o anúncio de uma epidemia semelhante à da peste negra: Encerramento de empresas, despedimentos, corte em áreas sensíveis como a saúde, a educação e a segurança, aumentos astronómicos nas despesas correntes (água, eletricidade e outros bens e serviços essenciais), corte nos salários, já de si exíguos em relação à maioria dos países do "el+do-(Euro)+ado" (leia-se "eldorado"), são apenas os estigmas essenciais da aflição que pouco a pouco destrói a estrutura social do País e o equilíbrio psicológico de cada um. Que mais nos espera?
O tal "Eldorado" - que soa a Euro - afinal não tem nada de solidário, e parece ter-se transformado, não obstante as boas intenções dos fundadores da U.E., num feudo de três ou quatro grandes países que consolidaram as suas economias à custa dos mais débeis, a quem sacrificaram os meios nacionais de produção (agricultura, pescas, produção industrial, etc.) para engordarem as suas cada vez mais prósperas economias e sistemas de produção. Hoje, a poderosa Alemanha (nunca aprendemos com a História!) domina e interfere. Acompanhada mais discretamente pela França, impõe aos outros países o "dictat" das políticas sempre que lhe convém.
Até há pouco, estas clepto(motivas) colossais deixavam escapar algumas frases curtas sobre a possibilidade de tirar o tapete aos países incumpridores (entenda-se Grécia, Portugal e, logo mais, a Espanha, a Irlanda e outros...), e de nos obrigarem a sair do Euro. Agora vêm dizer que é preciso salvar a moeda única. Porquê esta mudança de atitude? Ainda faltará extorquir mais em juros de empréstimos para nos retirar da crise ou prolongar a nossa infausta agonia?
A experiência amarga vai-nos dizendo que é preciso desconfiar da magnanimidade destes próceres gananciosos que só veem o interesse dos seus eleitores e pouco se interessam com as nossas aflições, sobretudo quando ameaçamos os seus irrenunciáveis ganhos usurários. Essa gente habituou-se a viver bem, e não abdica dos seus lucros faustosos, custe a quem custar, doa a quem doer...
Sabemos, agora, que alguns políticos caseiros, eternizados no poder e na fanfarronice bacoca e carnavalesca, ditadores e palhaços disfarçados de democratas, têm gasto com despudor e impunidade, sem que aconteça o que a justiça reclamaria, aquilo que pertence ao sacrifício e às renúncias mais ou menos forçadas de todos os portugueses. Escorados em argumentos confusos de leis aprovadas por correligionários da sua cor ou coniventes com o "SPC" (Sistema Político em Curso), gastam o que não existe, na serena paz e tranquilidade de que outros pagarão as contas dos seus desmandos.
De buraco em buraco, de desfaçatez em desfaçatez, já temos o direito de suspeitar (para gravíssimo mal dos pecados alheios) que a crise pode ser bem maior do que aquilo que parece, e que nos competirá (não tenhamos ilusões) pagar as faturas da ingovernação e dos abusos externos e caseiros, já que a culpa destes senhores perdulários (eu acrescentaria criminosos descarados) morrerá solteira.
Quanto a mim, apetecia-me comprar um apartamento luxuoso (no Algarve, nas ilhas Faroé, no plácido Havai ou noutro lugar frequentado pelo "jet-set" mundial - exceto na Pérola do Atlântico, que isso pode ser perigoso -, um ou dois Ferraris, um jato particular, mobílias extravagantes para a minha casa, e, depois, não pagar nada, porque os vizinhos, amigos e inimigos pagariam a fatura que eu lhes mandaria enviar, sem possibilidade de recusarem. Afinal comem todos, ou a moral idade é só para alguns?
Assim vai o nosso País. E isto, infelizmente, não é nenhuma parábola, é a realidade.
Acordemos e indignemo-nos, antes que seja tarde!